Imagem em destaque

Imagem em destaque
Panorâmica de Maragogipe

sábado, 23 de julho de 2022

SEM TIBÚRCIO NÃO TEM LAVAGEM

 

Imagem ilustrativa/Internet

Para o jovem Vitor Santana.


No ambiente da lavagem muitos são os personagens envolvidos, as baianas, responsáveis pelo visual multicor dos seus jarros ornados de flores e com água de cheiro e seus esvoaçantes estandartes, os músicos da charanga e o povão que extravasa todo seu potencial lúdico durante o tempo que a fuzarca percorre a cidade.

Na festa de São Bartolomeu, desde que o poder público municipal assumiu a realização da “lavagem de Rua” esta passou a ser o evento de maior destaque graças à propaganda que é feita em todos os cantos do estado, atraindo milhares de pessoas. Porém, o personagem de maior popularidade e que mais chama a atenção na lavagem, sem dúvidas, é “Seu Tibúrcio”. Afinal quem é esse tal de Tibúrcio? Surgido há muito tempo durante a festa deve ter sido um homem do povo, alegre, descontraído, que “gostava de samba, tomava cachaça, fumava charuto e tocava pandeiro”. É difícil imaginar a lavagem de rua da Festa de São Bartolomeu sem a presença de “Seu Tibúrcio”.

No momento que a multidão se aglomera no adro da Igreja, o povo misturado às baianas e charanga, todos na espera da execução do Hino de São Bartolomeu para ao término deste ato de contrição e fé, espontaneamente, explodir de alegria  com os primeiros acordes do samba “quando vim da Bahia êta..., sem sombra de dúvida, é um espetáculo que mostra toda a alegria de um povo festeiro e hospitaleiro. E a partir daí ninguém mais contém a massa.

A lavagem começou, na segunda metade do sec. XVII, dando origem ao samba de roda, que nasceu em Maragogipe, segundo pesquisadores e historiadores, porque após a lavagem da Igreja de São Bartolomeu os senhores de engenhos permitiram que os escravos fizessem rodas de samba na área externa da igreja dando início a essa manifestação cultural. Pois bem, com a repetição deste evento pelos anos seguintes, sempre ao término do trabalho de lavar a igreja com água e sabão, foi possível permitir ao grupo que se deslocasse pelo vilarejo e todos pudessem tomar parte na brincadeira. Outro detalhe é de que no principio os instrumentos eram somente os vasilhames usados para o transporte da água, depois vieram os instrumentos de percussão e as músicas que eram na língua dos escravizados. Pouco tempo depois, consolidada a brincadeira, foram introduzidos os instrumentos de sopro e de corda e as músicas passaram a ser na língua  portuguesa, mas estas já surgiram com letras de duplo sentido, exceção para as letras que exaltavam a figura do Padroeiro. Bom frisar ainda que no principio era uma manifestação popular permitida apenas aos homens dado o ambiente em que a mesma  nasceu com promiscuidade e violência.

Nesse ambiente, nos anos trinta do século passado, surge a figura de “Seu Tibúrcio” um maragogipano que “gosta de samba, fuma charuto, toma cachaça e toca pandeiro” e como era natural amante da festa de São Bartolomeu. Esse personagem foi introduzido na lavagem para atingir a figura da cinderela maragogipana, uma moça que nasceu pobre, foi marisqueira, operária da Suerdieck, mas, conquistou o coração do poderoso empresário alemão e com ele casou-se. A inveja e maledicência visava atingir aquela criatura simples de Maragogipe, buscando diminui-la e então na lavagem de SB colocaram “seu Tibúrcio”, nos versos do poeta anônimo, como se ele fosse mulher, pois uma peça da indumentária feminina agora aparecia nele. Vejamos os versos:

“Quando vim da Bahia... êta

 Encontrei Seu Tibúrcio... êta

Com anágua bem dura...êta

Por cima da bu... êta”.

 

Assim, a picardia do poeta anônimo deixa claro que havia a intenção velada de atingir uma outra pessoa usando a figura de Tibúrcio. Acreditamos que Tibúrcio existiu, mas ele foi levado ao samba da lavagem de SB apenas por um desses caprichos do destino. Fato é que “Seu Tibúrcio” dominou a lavagem e sem ele não tem lavagem. Coisas de Maragogipe!

 

Julho de 2022/ABÍLIO UBIRATAN

 LEMBRETE 

    "Museus e arquivos, como se sabe, não são apenas lugares de passeio e entretenimento são locais de estudo e reflexão".

                                        Laurentino Gomes